quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

Saussure Bebeu da Fonte Mística

Ferdinand de Saussure (Genebra, 26 de novembro de 1857 - Morges, 22 de fevereiro de 1913) foi um linguista e filósofo suíço cujas elaborações teóricas propiciaram o desenvolvimento da linguística enquanto ciência e desencadearam o surgimento do estruturalismo. Além disso, o pensamento de Saussure estimulou muitos dos questionamentos que comparecem na linguística do século XX.

Filho de um eminente naturalista, foi logo introduzido aos estudos linguísticos por um filólogo e amigo da família, Adolphe Pictet. Saussure estudou Física e Química, mas continuou fazendo cursos de gramática grega e latina. Por fim, convenceu-se que sua carreira estava nos estudos da linguagem e ingressou na Sociedade Linguística de Paris. Estudou línguas européias em Leipzig e aos vinte e um anos publicou uma dissertação sobre o primitivo sistema das vogais nas línguas indo-europeias, a qual foi muito bem aceita.

Defendeu sua tese sobre o uso do caso genitivo em sânscrito, em Berlim, e depois retornou à Paris, onde passou a ensinar Sânscrito, Gótico e Alto Alemão e depois Filologia Indo-Europeia. Retornou a Genebra, onde lecionou sânscrito
e linguística histórica em geral. Em 1906 foi encarregado de ensinar Linguística Geral, e com isso realizou conferências que apresentaram conceitos que mudaram completamente o modo de encarar a linguística.


Entendia a linguística como um ramo da ciência mais geral dos signos, que ele propôs fosse chamada de Semiologia. Graças aos seus estudos e ao trabalho de Leonard Bloomfield, a linguística adquire autonomia e seu objeto e método próprio passam a ser delineados. Seus conceitos serviram de base para o desenvolvimento do estruturalismo no século XX. Abaixo seguem as famosas dicotomias enunciadas por Saussure:

- Língua X Fala:
Saussure também efetua, em sua teorização, uma separação entre língua e fala. Para ele, a língua é um sistema de valores que se opõem uns aos outros e que está depositado como produto social na mente de cada falante de uma comunidade, possui homogeneidade e por isto é o objeto da linguística propriamente dita.

Diferente da fala que é um ato individual e está sujeito a fatores externos, muitos desses não linguísticos e, portanto, não passíveis de análise.

- Sincronia X Diacronia:
Ferdinand de Saussure enfatizou uma visão sincrônica, um estudo descritivo da linguística em contraste à visão diacrônica do estudo da linguística histórica, estudo da mudança dos signos no eixo das sucessões históricas, a forma como o estudo das línguas era tradicionalmente realizado no século XIX.

Com tal visão sincrônica, Saussure procurou entender a estrutura da linguagem como um sistema em funcionamento em um dado ponto do tempo (recorte sincrônico).


- Sintagma X Paradigma:
O sintagma, definido por Saussure como “a combinação de formas mínimas numa unidade lingüística superior”, e surge a partir da linearidade do signo, ou seja, ele exclui a possibilidade de pronunciar dois elementos ao mesmo tempo, pois um termo só passa a ter valor a partir do momento em que ele se contrasta com outro elemento.

Já o paradigma é ,como o próprio autor define, um "banco de reservas" da língua fazendo com que suas unidades se oponham pois uma exclui a outra.

- Significante X Significado:
O signo linguístico constitui-se numa combinação de significante e significado, como se fossem dois lados de uma moeda.

O significante do signo linguístico é uma "imagem acústica" (cadeia de sons). Consiste no plano da forma.

O significado é o conceito, reside no plano do conteúdo.

Contudo, indubitavelmente, a teoria do valor é um dos conceitos cardeais do pensamento de Saussure. Sumariamente, esta teoria postula que os signos linguísticos estão em relação entre si no sistema de língua. Entretanto, essa relação é diferencial e negativa, pois um signo só tem o seu valor na medida em que não é um outro signo qualquer: um signo é aquilo que os outros signos não são.
"O binarismo redescobre-se nos centros de interesse e na própria personalidade do linguista genebrino, que trocava frequentemente Genebra por Marselha; nessas viagens regulares, ele levava pequenos cadernos que cobria de meditações sobre os textos védicos e saturninos da poesia sagrada da Índia e de Roma. Assim foi que ele encheu 200 cadernos a respeito dos anagramas e efetuou toda uma pesquisa cabalística para ver se não haveria um nome próprio disseminado no interior desses textos que fosse, ao mesmo tempo, o destinatário e o sentido fundamental da mensagem.

Perturbado por suas descobertas, Sausssure até se interessa por sessões de espiritismo durante os anos de 1895-1898. Essa dualidade não é, aliás, exclusiva de Saussure, vamos encontrá-la também em outros cientistas. Foi o que ocorreu com Newton, por exemplo, que enchia milhares de páginas sobre alquimia ao mesmo tempo em que redigia os seus Principia. O fundador da mecânica clássica e da racionalidade ocidental estava também empenhado na descoberta da pedra filosofal.

Haveria, portanto, naquele que Luis-Jean Calvet denominou segundo Saussure (22), a idéia da existência de uma linguagem sob a linguagem, de uma codificação consciente ou inconsciente das palavras sob as palavras, uma busca de estruturas latentes, das quais não existe o menor traço no Curso de Linguística Geral, no Saussure oficial, ajardinado. Saussure chegou mesmo a ser convocado em 1898 por um professor de psicologia de Genebra, Fleury, para examinar o caso de glossolalia de Mlle.Smith que, sob hipnose, declarava falar sânscrito. Saussure, professor de sânscrito, deduziu que "não era sânscrito, mas que nada havia que fosse contra o sânscrito".(23)

Todos esses cadernos foram cuidadosamente mantidos em segredo pela família e somente em 1964 Jean Starobinski pôde publicar parcialmente esses anagramas.(24)

Poder-se-á então inaugurar uma nova direção nas investigações, apoiando-se nessa descoberta, em meados dos anos 60, com destaque para Julia Kristeva. Pode-se falar, com Jakobson, da "segunda revolução saussuriana", por muito tempo reprimida.
(...)

Essa segunda filiação permitirá o retorno do sujeito. "

Notas:

(22) CALVET, L.-J., Pour et contre Saussure. Paris:Payot, 1975.

(23) Louis-Jean Cavet, entrevista com o autor.

(24) J. Starobinski, Mercure de France, fevr. 1964; depois, Les mots sous les mots. [Paris:Gallimard], 1971.

(Texto extraído da obra de François Dosse,"História do Estruturalismo", Vol.1, cap.7: "O Corte Saussuriano". )

Externas:

- Obra Teoria e Criticismo - Heidegger e Saussure - em inglês, vide link abaixo:

2 comentários:

  1. Meu comentário anterior cadê?!!! Só para garantir...adorei o blog!Parabéns!

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  2. muito bom esse seu artigo. foge da visão comum sobre saussure e o estruturalismo. você sabe algo mais sobre este psicólogo genebrino Fleury?

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